E.Se apresenta novo álbum: “Hubris”

“Hubris” foi lançado dia 10 de maio e é o terceiro álbum do almadense. Com o objetivo de ser “um artista a ter em conta no panorama do rap nacional”, E.Se esteve em entrevista com o Jornal desacordo, onde dá a conhecer um pouco mais deste seu novo trabalho, falando também do seu percurso até agora.

Fotografia de Francisco “queragura” Gomes.

O início

Fala-nos um bocadinho da origem de tudo isto: quem és e como é que começou o teu percurso?

O meu nome é Carlos Alves, comecei a fazer música oficialmente provavelmente talvez desde 2018, 2019. Depois, o meu primeiro disco sai em 2021. Sou natural de Almada e a música mais urbana e a expressão de cultura urbana sempre esteve muito próxima de mim. Tendo crescido em Almada e na Margem Sul, e embora inicialmente não compusesse nada oficialmente, desde muito cedo ouvia instrumentais em loop e às vezes com algumas ideias que ia explorando em casa assim de uma forma não muito organizada. 

Mais tardiamente, e já quando estava a trabalhar, apercebi-me que sentia saudades de ter algum veículo criativo para onde pudesse canalizar, abstrair-me um bocado do meu mundo do trabalho das 9 às 7 e a música ganha um bocado esse peso maior, [passar de] não ser só ouvinte para também compor alguma coisa. E foi mais ou menos em 2018, que eu senti essa pressão maior de necessidade de escrita e de composição e de abstração. 

Comecei a fazer e a compor, inicialmente também instrumentais, [que] eram só explorações, mas já a pensar num disco de apresentação, porque eu já tinha conceitualmente [uma] noção daquilo que queria fazer, que era tentar criar uma persona, uma expressão das coisas que são hipotéticas e que às vezes podem ser hipoteticamente negativas ou interpretadas de uma forma. Imagina “e se alguma coisa corre mal?”… eu sou médico como profissão e muitas vezes essa exigência e essa obsessão levam-me a duvidar de mim próprio e ter muitos estados às vezes negativos na minha cabeça. E eu pensei que podia transformar esse meu traço obsessivo numa coisa positiva: “e se fizesse com isso alguma coisa criativa?” Veio daí. 

Discografia: processo criativo, temáticas e inspirações.

E.Se já tinha dois álbuns lançados antes de “Hubris”: “Serotonina” e “Mangrove”.

Fala-nos um pouco dos teus trabalhos anteriores.

O meu disco de apresentação, “Serotonina”, já foi um bocadinho a minha forma de ir buscar serotonina à composição musical e também afastar-me um bocado do meu traço ansioso e obsessivo através da música. O meu primeiro disco de apresentação é esse, que sai em março de 2021. 

Depois de ter feito essa minha apresentação enquanto artista de rap nacional acabei por [pensar] “ok já me apresentei, deixa-me tentar fazer o meu segundo disco”, em que já não é tão retrospetivo no meu processo de crescimento de vida adulta e as maiores dores de crescimento, por assim dizer, e se calhar faz alguma coisa de mais livre e conceptualmente, aquilo que se calhar gostava de explorar, que era uma música assim com uma textura de hip-hop mais melódico, com R&B à mistura. O “Mangrove” foi um bocado isso, foi uma vertente Soulquarians, uma geração de artistas desde o D’Angelo aos The Roots, à Erykah Badu e eu queria tentar dar essa textura, trazer essa textura  para o rap. E o “Mangrove” acaba por ser isso: é mais uma questão já de afirmação e não tanto de exploração minha enquanto artista.

Como funciona o processo criativo dos teus trabalhos?

O meu processo escrito é muito derivado. Eu tenho o caderno… hoje em dia já não há aquela questão [de usar o] caderno, não tenho caderno físico, já não é essa questão tão poética de escrever. Se calhar ainda há, mas no dia-a-dia não é muito prático e acabo por apontar nas notas no meu telemóvel. Normalmente aponto ideias soltas, sei lá, dois versos ou alguma coisa que já que rima ou que já expressa uma certa metáfora ou uma certa ideia. Mas normalmente, o que me desbloqueia mesmo são instrumentais. É aí que eu procuro perceber o que é que um determinado instrumental me leva a querer falar. Eu tenho determinados tópicos de que quero falar no meu disco e procuro instrumentais que transmitam essas emoções ou o espaço para falar desses temas. E depois escrevo a partir daí e normalmente faço determinadas melodias ou determinados segmentos métricos na minha cabeça… ou gravo mesmo sem palavras propriamente ditas. E depois preencho esse espaço com o meu processo de escrita a seguir.

Venho cada vez mais a perceber que mais artistas hoje em dia fazem isso. Se calhar noutra geração as pessoas escreviam e depois aplicavam num determinado instrumental, por exemplo. E hoje em dia já é mais frequente, ou diria que é igualmente tão frequente, ter-se são instrumental, pensar-se em que estilo métrico e melódico é que sequer para aquele registo e depois a partir daí escrever diretamente para isso.

“Hubris”, o novo álbum

Depois de um 2023 sem qualquer trabalho lançado, E.se lançou este mês um novo álbum:

Comecei a produzir o disco em 2023 e se calhar já tinha o disco muito avançado. Na minha perspetiva, iria ser inicialmente um EP e eu estava pronto para lançar no final de 2023. Depois transformou-se num disco e eu queria explorá-lo ao seu potencial máximo e ter calma para avançar, e também preparar o lançamento para as coisas viverem o seu potencial máximo, não ficar frustrado com [o pensamento de que] se calhar a música podia ter chegado a mais pessoas e não chegou porque eu tive pressa em lançá-la para fora e não planeei as coisas. E [assim] fiz os passos na maneira certa.

Este está a ser partilhado através da sua plataforma, a Produções Hipotéticas:

A Produções Hipotéticas [é] uma plataforma independente que objetiva, ou pelo menos que eu tentarei que lance artistas independentes como eu e já tenho isso mais ou menos para acontecer. Não têm necessariamente ser da Margem Sul, mas a equipa é maioritariamente da Margem Sul e de Almada.

O que é o “Hubris”?

É um um disco de exploração estética, que também penso que seja mais um degrau na minha afirmação enquanto um artista a ter em conta no panorama do rap nacional e não só do rap nacional, também da música mais mainstream ou aproximar se da música mais mainstream.

Acho que é bastante vanguardista no sentido do que se faz na música rap em Portugal. É diferente do que se está a fazer porque acho que a estética sonora atual está muito fixada no trap pop e essa é a sonoridade estética que está a ser maioritariamente feita e eu estou a afastar-me um bocado disso, a fundir um jazz mais contemporâneo. Uma das minhas melhores referências é o Yussef Dayes, do Reino Unido, que faz jazz contemporâneo e [eu quis] trazer essa estética e fundi-la com rap. 

Há uma música que eu posso dizer que se chama “Laced[/Cristalino]” que no sentido de slang é de cortar, de cortar algo, normalmente é utilizado na linguagem urbana com as drogas. Mas o que eu estou a tentar fazer é cortar estéticas sonoras, portanto, no fundo estou a misturar rap que poderia ser mais pop e melódico com jazz contemporâneo. 

O hubris, palavra, o significado e a metáfora é uma conotação negativa, normalmente é uma extravagância quase arrogante e audaz, um exagero. Eu tento fundir esse exagero estético, essa quase arrogância, de fundir duas coisas que provavelmente não estariam tão unidas. Essa ideia do exagero, da obsessão muitas vezes está presente na minha vida e traz as coisas também positivas que são eu ser obcecado, eu querer fazer coisas: meter na minha cabeça fazer um disco e faço um disco e chego a casa e estou cansado mas descomprimo numa música, numa letra. 

Em termos de produção, posso dizer que ela está maioritariamente entregue a três produtores… quatro, incluindo a mim, que pela primeira vez também exploro o lado de produtor de algumas músicas. É o Ned Flanger, o Luun e o Minus (Mr. Dolly), que é do Porto. Todos eles têm cores um bocado diferentes.

Apresentação de “Hubris” ao vivo

E.Se explicou ao desacordo que a sua intenção era, logo a seguir ao lançamento de “Hubris”, partir para a apresentação do mesmo em Lisboa e no Porto. O objetivo foi cumprido e as datas já foram divulgadas:

Porto- 14 de junho- Maus Hábitos

Lisboa- 15 de junho- Musicbox

Os bilhetes já estão disponíveis para compra: para Lisboa, aqui e para o Porto aqui.

Pretendes fazer mais concertos?

Posteriormente, quero tentar chegar a cidades que normalmente não têm tantos concertos mas que têm casas culturais que me cativam. Um objetivo meu é tocar em Almada depois de apresentar em Lisboa e no Porto, porque é a minha cidade Natal, onde eu cresci e gostava de fazer algo até inclusivamente gratuito. Isso é o meu objetivo, uma sala que seja de entrada livre. 

E depois transpor, se calhar numa fase pós verão, porque no verão é sempre difícil pelos festivais, as pessoas estão mais viradas para os festivais, é difícil estarem centradas em concerto de apresentação de  disco em cidades mais pequenas, percorrer as zonas regionais do país e apresentar o disco em outras salas tipo Coimbra, Braga, Aveiro, por aí fora, Algarve, Torres Vedras. O objetivo é andar pelas salas do país, tipo Salão Brasil e por aí fora, e ir tocando nessas salas… e festivais, claro, se surgir essa oportunidade.

Ouvir “Hubris”

“Hubris” conta com 15 músicas. Podes ouvir o álbum na íntegra, clicando abaixo:

Em baixo, podes encontrar ainda o videoclipe do single “Hubris”, música que saiu antes do lançamento do álbum na íntegra.

Escrito por: José Pereira, Marta Ricardo.

Editado por: Diana Rebelo Trigueiro

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