António Garcez lança “Onde É Que Está O Capital?”

No dia 8 de dezembro de 2023, António Garcez reeditou o single “Onde é que está o capital?”. Passados 42 anos desde o lançamento original, o artista considera que o tema tem ainda um caráter atual e, por isso, volta a questionar quem tem o “capital”.

Capa do single “Onde é que está o capital?” (Fonte: Paula Cabeçadas & Cristina Pereira – Assessoria de Imprensa)

No sentido de “adaptar” a canção aos dias de hoje, a música conta com novos arranjos o que, segundo o artista serve para melhor enfatizar que apesar dos tempos mudarem, este tipo de críticas económico-sociais em jeito de canção continuam atuais e legítimas.

António Garcez foi uma figura relevante do rock em Portugal nos anos 70 e 80. Integrou projetos como os Pentágono; Arte & Ofício ou Roxigénio, tendo depois “desaparecido”.

O artista nascido em Matosinhos, mudou-se no meio da década de 80 para os Estados Unidos. Regressa ocasionalmente a Portugal para matar saudades, que foi, precisamente o que aconteceu para a reedição de “Onde está o capital?”.

O Jornal desacordo esteve à conversa com o artista na sequência do lançamento desta nova versão da sua canção e para aferir que projetos podemos esperar num futuro próximo.

Tudo indica que o músico tem novos projetos prestes a ser anunciados em matéria de concertos e novas canções (ou reedições de canções antigas).

A Entrevista

A reedição do seu single “Onde é que está o capital” traz um espírito novo em relação à versão original que se nota, desde logo, no novo arranjo. A mensagem continua, no entanto, a ser atual apesar dos diferentes contextos?

Onde e que está o capital sofreu arranjos [novos] como é óbvio, mas não é muito diferente do original musicalmente falando. A mensagem continua super atual porque estamos a falar de Portugal: Salários miseráveis, políticos da treta e ricos desinteressados no crescimento do País.

Porque decidiu que este seria o momento de reeditar a “Onde é que está o capital”?

Nestes últimos três anos tenho gravado músicas de cariz mais rockeiro e o resultado em termos de propagação é limitado devido ao facto de muita gente não entender inglês. Aliando este facto ao fator económico pareceu-nos ser uma altura boa para reeditar o Capital, crendo que este tema possa dinamizar a atenção dos curiosos.

Afirmou [num press release] que a maioria das letras das canções que se caracterizavam como pertencentes ao chamado “rock português” no início dos anos 80 tinham um “cariz popular” e não abordavam a situação económico-social do país. Acha que os artistas têm o dever de abordar estas temáticas nas suas canções?

Não acredito em obrigações no que toca a música, mas acredito em sensibilidade; ou seja, o rock Português entre aspas fez-me recuar no tempo trazendo memórias do “zumba no caneco” ou “mama eu quero mamar” temas que funcionam até num funeral pondo as carpideiras a cantar. Quando há sensibilidade e bom gosto, temas de cariz social podem unir as pessoas e torná-las menos insensíveis ao meio que as rodeia. De resto todos os meus trabalhos com as diferentes bandas de que fiz parte sempre tiveram músicas de cariz social, mas como foram escritas em Inglês perderam-se na tradução.

Hoje em dia, há mais artistas e canções que abordam essas temáticas em Portugal ou acha que poderiam haver mais?

Não faço a menor ideia do que se faz hoje por essas bandas em termos de rock ou música em geral, mas se a música por essas bandas fosse vinho com certeza seria martelado para além de regado com pseudo intelectualismo ou mau gosto. Exemplo: Se nos fecharmos numa casa de banho por 10 minutos o cheiro desaparece. Hoje só há imitadores e bons sem dúvida, mas não chega. A criatividade é coisa do passado!

O atual clima de instabilidade política, económica e social é algo que o inspira, de certa forma, a fazer novas canções ou, como é o caso, a recuperar canções antigas como a que agora reeditou?

A instabilidade política em Portugal não é muito diferente da de outros países com excepção da corrupção, claro! Mas recuperar canções que escrevi há muitos anos é uma possibilidade, já que imensa gente gostaria de ouvir alguns dos velhos temas quer do Arte & Ofício quer do Roxigênio.

António Garcez (Fonte: Paula Cabeçadas & Cristina Pereira – Assessoria de Imprensa; Rui Vasco)

Numa entrevista que deu à Blitz em novembro de 2023 referiu que o rock and roll português era elitista nos anos 60 e 70. Considera que o rock and roll e a música portuguesa, de forma geral, estão menos elitistas atualmente?

Quando disse que o rock dos 60 e 70 era elitista, referia-me ao facto de que o público em geral era mais conhecedor da língua Inglesa, mais educado academicamente, e consequentemente menos blue collar e mais aburguesado.

Depois de ter feito projetos no passado em que cantava, essencialmente, em inglês, pretende agora abraçar a experiência de cantar em português?

Não é minha intenção escrever numa língua ou outra de uma forma forçada. Às vezes escrevo em inglês, outras em português, por isso depende muito de como a letra, intenção da mensagem e a dinâmica da música se abraçarem.

Acha que o estigma de cantar em inglês em Portugal está a desaparecer?

Não tenho a menor ideia se o estigma de cantar em inglês está a mudar em Portugal, mas muitas vezes pergunto a mim próprio porque é que há um profundo sentimento chauvinista em relação à língua portuguesa versus inglesa? As pessoas deviam concentrar o criticismo nas recentes mudanças ortográficas na língua que pelos vistos era de Camões e agora é de não sei quem. Felizmente o futebol é mudo, de outra forma o Ronaldo neste momento estaria a jogar em Fornos de Algodres. De resto, onde é que as pessoas pensam que chegam a cantar exclusivamente em português? Infelizmente só uma mão cheia deles sobrevivendo e curiosamente são sempre os mesmos. Os putos novos, alguns deles muito bons no que fazem, não têm a menor oportunidade de saírem do anonimato.

Tem planos para concertos num futuro próximo que nos possa revelar?

Claro que tenho planos para concertos num futuro próximo; parar é morrer, esse é o meu mote!

Estamos a trabalhar pesadamente no sentido de arranjar alguns concertos organizados por outros e organizados pela minha equipa também.

Podemos esperar o lançamento de mais música da sua parte? Se sim, continuará a lançar na língua de Camões?

Claro que estamos sempre a cozinhar novo material e eventualmente anunciaremos o que de novo irá surgir. Quanto à língua, prefiro a de vaca!

Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.

Escrito por: José Pereira

Editado por: Joana Matos

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