O processo de nomeação da magistrada foi marcado pelas questões polémicas quanto às decisões que a magistrada tomara, nomeadamente as que mais marcaram o seu passado enquanto juíza, assessora jurídica e defensora pública federal.

Ketanji Brown Jackson foi nomeada para o Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América, oficialmente substituindo o juiz Stephen Breyer, sendo a 116ª juíza deste tribunal. O resultado da nomeação foi 53-47, de 51 votos favoráveis necessários para concretizar a escolha de Joe Biden. Da bancada dos republicanos, apenas os senadores Susan Collins (Maine), Mitt Romney (Utah) e Lisa Murkowski (Alasca) votaram favoravelmente à eleição da magistrada, contrariando a liderança do partido.
A candidata ao Supremo Tribunal já tinha a sua nomeação garantida, uma vez que a maioria da Câmara Alta é dos democratas, à qual se agregaria o voto de desempate da vice-presidente, Kamala Harris – também a primeira mulher a ocupar um dos mais altos cargos políticos.
As declarações iniciais dos trabalhos da Comissão de Assuntos Judiciais do Senado abordaram elogiosamente o facto de ser uma candidatura histórica. E de facto, no dia 7 de abril, realizou-se uma nomeação histórica que alterou o paradigma (mesmo que temporariamente) da maioria de juízes masculinos e brancos na mais alta instância da justiça norte-americana. A confirmação da nomeação, porém, não exercerá qualquer impacto no equilíbrio ideológico do tribunal, uma vez que há apenas uma substituição entre liberais.
A Comissão tem a função de fiscalizar o Departamento de Justiça dos EUA, nomeadamente conduzir uma análise à experiência das nomeações do poder executivo e judicial. Neste sentido, Brown Jackson teve grande parte do seu know-how averiguado pelos senadores que constituem a comissão, especialmente enquanto juíza da Corte de Apelações dos Estados Unidos para o distrito de Columbia e enquanto defensora pública.
Grande parte da polémica em que esteve envolvida, remeteu para as decisões jurisdicionais da magistrada contra pedófilos. A conduta branda de Ketanji foi constantemente questionada pelos senadores republicanos Tom Cotton e Josh Hawley, nomeadamente pelo facto de aplicar penas inferiores às recomendadas em casos de posse de pornografia infantil – prática cada vez mais costumeira, uma vez corroborado que os acusados não são os produtores das imagens.
Tom Cotton ainda suscitou fazer uma comparação provocativa entre o apelido da magistrada e do antigo juiz, Robert H. Jackson, que participara na equipa de acusação dos julgamentos de Nuremberga, à qual o senador afirma que se Brown Jackson integrasse a equipa, iria tentar defender os “nazis em Nuremberga”. Esta acusação surge no seguimento da juíza ter representado em tribunal 4 detidos da prisão de Guantánamo, à qual se rotulou ser uma defensora de terroristas. Mas as provocações não ficaram por aqui.

Os senadores Ted Cruz e Lindsey Graham tentaram suscitar um debate perigoso e tendencioso com Ketanji: Cruz referiu-se ao conteúdo de um livro denominado “Antiracist Baby” e questionou a juíza se as crianças são, realmente, ensinadas a ser racistas ou não – à qual esta respondeu que as suas posições e opiniões, especialmente quanto a livros, não faziam parte do seu trabalho enquanto juíza; Graham perguntou a religião de Jackson (protestante), à qual esta retrucou que as suas crenças nada dizem respeito ao trabalho de um juiz.
A senadora Marsha Blackburn ainda questionou a candidata se poderia definir a palavra “mulher”, no seguimento da atual discussão em volta da comunidade transsexual, à qual Brown Jackson contrapôs relembrando que não é bióloga e que se uma disputa jurídica suscitasse a definição de uma palavra, que fá-lo-ia consoante a legislação existente.
Resta aguardar as seguintes intenções de voto de Ketanji B. Jackson e respetivas inclinações éticas e morais, e observar as novas dinâmicas decorrentes da nova configuração do tribunal, num ano em que se irá discutir o direito ao aborto, à posse de armas e a liberdade religiosa, de implicações estruturais por todos os tribunais dos Estados Unidos da América.
Escrito por: João Miguel Fonseca
Editado por: Renato Soares