A tributação de carbono é uma medida política bastante utilizada para, em teoria, reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Este mecanismo envolve a aplicação de taxas às emissões de carbono, estipulando, deste modo, impostos diretos formulados pelo governo. A estas taxas adicionam-se ainda as ETS (Emission Trading Schemes), isto é, um sistema de cap-and-trade baseado na fixação de limites de carbono que ao serem ultrapassados pelas empresas, obrigam-nas a comprar novas autorizações para exceder as suas emissões iniciais, levando a uma poupança estratégica nas emissões, fazendo com que poluir mais, saia mais caro (The World Bank Group, 2023).
Neste sentido, estas medidas têm como ideia por detrás de criar incentivos fiscais à redução das emissões ao nível individual, reduzindo as emissões de carbono a nível nacional. Ademais, como benefício desta medida é ainda apontado por vários economistas o investimento em tecnologias mais sustentáveis e a consequente aceleração da transição verde. Assim, a tributação de carbono tem sido utilizada enquanto uma componente essencial a praticamente qualquer política de combate às alterações climáticas.
Ao comparar as ETS com taxas de carbono, denota-se que as ETS providenciam certeza sobre a quantidade ao estipularem limites rígidos às empresas e consumidores. Contudo, com as taxas regulares há uma consistência na sua aplicação, que independentemente das quantidades emitidas afetam, unitariamente, de igual modo, todos os poluentes sem considerar o tamanho e compreensão da sua contribuição. Para além disso, os governos têm somente a experiência ao cobrar e implementar impostos, já em relação a ETS, a aplicabilidade torna-se mais complexa. Isto pois, além de antecipar os custos extras das licenças, surge uma nova preocupação com a distribuição, venda e vigilância dos limites impostos às empresas (Green, 2021).
Neste sentido, não é incomum que determinados governos administrem, erroneamente, os limites para vários anos, simultaneamente, afetando os preços futuros e sobrepondo limites criando uma injustiça emitiva. Associado a uma característica falta de vigilância fidedigna que possa gerir relatórios que escrutinem este mesmo sistema.
Apesar da centralidade desta tipologia de medidas no combate às alterações climáticas, o número de estudos que fazem uma avaliação dos impactos da tributação de carbono nas reduções das emissões de gases com efeito de estufa são bastante reduzidos e os que de facto foram conduzidos apontam para uma redução entre 0 e 2% nas emissões totais a nível nacional, no foco europeu (Green, 2021).
Um dos epicentros da aplicação deste tipo de medidas políticas é a Califórnia, que implementou este tipo de sistemas em 2013. Desde então, é alegado que as emissões reduziram em 8% dentro de todo o estado, sendo atualmente 85% da poluição a carbono do estado administrada por esta medida. Ainda que num tom superficial isto seja positivo, o que se pode observar é que o número licenças de poluição e a sua oferta é bastante maior do que a poluição e o número de poluidores registados. Consequentemente, isto fez com que os preços destas mesmas licenças sejam baixos e a previsão para este cenário é de continuidade de baixos preços na oferta. Esta permissibilidade no sistema cria um cenário em que o preço para poluir é baixo para empresas com fluxos avultosos, fazendo com que as pequenas e médias empresas estejam numa situação de desvantagem estratégica, ainda que o seu impacto seja menor. As grandes corporações continuam a poder poluir num sistema barato e benéfico não só para os lobbies de pressão política das grandes petrolíferas e indústrias poluentes que têm o sistema redesenhado consoante as suas vontades, apesar da tentativa de mudança estrutural de 2017 (Stokes & Mildenberger, 2020), como do próprio estado da Califórnia que acaba por arrecadar mais impostos para o seu orçamento.
Contudo, esta não aceitação não é só suportada pelas elites, em 2018, após 4 longos anos de negociação das tributações de carbono em França, a apresentação da taxa de carbono de 44.6€/tCO2, num cenário de preços elevados dos combustíveis, gerou o descontentamento generalizado da medida, criando o Movimento dos Coletes Amarelos (Salvador, 2018). Isto deve-se a um entendimento generalizado que este tipo de medidas decalca as assimetrias na distribuição de riqueza e obriga as camadas mais pobres da sociedade a serem pauperizadas e a “pagarem” a transição verde, enquanto que os mais ricos continuam a poluir pois têm recursos para tal.
Por outro lado, os principais estudos apontam uma aprovação de uma larga maioria da população para a aplicação de medidas que combatam a crise climática (Lourenço, Santos, & Hasna, 2022), demonstrando que há uma incoerência entre a vontade da população e a correta aplicação e exposição de medidas eficazes.
Ou seja, há uma necessidade na reformulação das medidas, devendo haver uma precedência para a aplicação de subsídios e normas que apoiem as comunidades mais afetadas, de modo a facilitar e distribuir os meios para uma transição justa, aliada a um forte investimento em infraestruturas públicas sustentáveis. Esta transição não deve ser paga de igual modo, tendo em conta a desigualdade na distribuição de rendimento ao redor do globo, por mais que seja inegável que qualquer transição seja custosa, esse argumento não pode assolar a sobrevivência de pessoas em situações vulneráveis, que apesar de não serem pobres o suficiente para estarem fiscalmente isentas destas medidas, terão a sua qualidade de vida altamente afetada por uma medida única e cega a outro tipo de condicionantes.
Na verdade, pode-se concluir também que há um “pessimismo democrático” em que as pessoas não confiam no governo devido à sua inação e incompatibilidade histórica com aquelas que são as vontades da maioria e uma incapacidade na aplicação governamental, devido à inexistência de um consenso político sobre como proceder na agenda verde. Há também uma falta de vontade de culpar os grandes poluidores que necessitam de uma reposta política pragmática que os responsabilize socialmente.
Bibliografia:
Green, J. F. (2021, 03 24). Does carbon pricing reduce emissions? A review of ex-post analyses. IOP Science. Retrieved from https://iopscience.iop.org/article/10.1088/1748-9326/abdae9/meta
Lourenço, N., Santos, C., & Hasna, Z. (2022). Sobre os efeitos agregados e distributivos da tributação do carbono em Portugal.
Salvador, S. (2018). Coletes amarelos: quem são, o que querem e que ameaça representam para Macron? Diário de Notícias. Retrieved from https://www.dn.pt/edicao-do-dia/30-nov-2018/coletes-amarelos-quem-sao-o-que-querem-e-que-ameaca-representam-para-macron-10254597.html
Stokes, L. C., & Mildenberger, M. (2020). The Trouble with Carbon Pricing. Boston Review. Retrieved from https://www.bostonreview.net/articles/leah-c-stokes-matto-mildenberger-tk/
The World Bank Group. (2023). Carbon Pricing Dashboard. Retrieved from The World Bank: https://carbonpricingdashboard.worldbank.org/
Escrito por: João Martins
Editado por: João Fonseca