Cas Mudde e Cristóbal Rovira Kaltwasser desmistificam o fenómeno populista, abordando a essência do conceito, a sua mobilização e atuação nas sociedades europeias, norte e sul-americanas, as suas consequências e formas de combate, dando especial atenção à interpretação e análise de líderes populistas e das origens do fenómeno.

“Populismo: Uma Brevíssima Introdução” conta com a mestria de Cas Mudde, um cientista político com investigações centradas no extremismo político, os partidos políticos e a integração europeia e de Cristóbal R. Kaltwasser, um sociólogo também ele especializado em ciência política, para a análise e desconstrução de um conceito amplo a todo o espetro político.
A abordagem do assunto é introduzida através de um esclarecimento sintético dos conceitos envolventes ao populismo, nomeadamente a gestão das ideias de povo, de elite e da vontade geral – aqui, mostra-se que a dinâmica entre povo e elite ocorre, essencialmente, com a corrupção do segundo e a vontade geral do povo contestar e trazer mudanças. Tudo o que é abordado na obra decorre da dinâmica destes 3 conceitos, e, apesar das inúmeras demonstrações de populismo na América do Norte, América Latina e Europa, a gestão distinta dos conceitos essenciais saltam à vista.
O que entendemos hoje como populismo diz-se ter surgido no final do século XIX na Rússia e desde então tem-se procurado encaixar este conjunto de práticas no ambiente político, encostando-o a alguma ideologia. Na verdade, o que esta obra nos mostra é que o populismo é indiferente a ideologias, havendo, no entanto, o que parece ser uma seleção regional: na América Latina, este fenómeno é frequentemente eleito, pondo-se um ponto final às oligarquias que corrompem os Estados, enquanto na Europa está, na maior parte dos casos, associado a ideologias de direita radical, eurocéticos, anteriormente mais focados no combate ao comunismo.
“Não é por acaso que uma parcela significativa do eleitorado dos partidos populistas de direita radical da Europa consiste na classe trabalhadora «nativa»: esta deixou de se sentir representada pelos partidos sociais-democratas, que abraçaram a globalização económica, a integração europeia e o multiculturalismo”.
É de realçar, a par desta citação, que um entrave ou doutrina isolacionista contra a corrupção da Nação, não irá resolver os problemas que os populistas europeus dizem existir. Não obstante e como os autores apontam, algumas das pressões que saem dos partidos ou movimentos populistas, acabam por movimentar mecanismos democráticos a incrementar determinados preceitos. Assim, a relação populismo-democracia traz-nos tanto bons aspetos, a favor da maior representação popular e melhor resposta dos governos, mas sendo prejudicial para as minorias, com a constante invocação da regra da maioria e da soberania popular, debilitando instituições que promovam a defesa de direitos fundamentais universais e provocando instabilidade na criação de acordos ou coligações políticas – “processo de des(democratização)”.
A caracterização que se faz do líder populista é particularmente interessante – além do curioso facto de ninguém se admitir como populista – pois revela as antiquadas bases de uma sociedade machista, que procura a resolução de problemas (neste sentido, de problemas políticos) num homem-forte carismático, corajoso, potencialmente violento e de governação autoritária, que toma decisões rápidas a favor do senso comum, como bom representante da vox populi que diz ser, com todo um apoio por trás de um culto de chefe (por exemplo, Juan Péron da Argentina ou Umberto Bossi da Itália). Não obstante, abordando as exceções: mulheres, com a a atual líder da Frente Nacional, Marine Le Pen e empresários, outsiders e líderes étnicos.
O livro termina com chave de ouro, procurando esclarecer as causas na base do fracasso ou sucesso do populismo, considerando o que, mormente, está na causa da sua procura política. Aliás, tanto as razões pela procura da política populista, como o que esta oferece, atendendo à caracterização generalizada da mobilização populista – seja numa liderança personalista, num movimento social (como o Tea Party) ou num partido político – dando especial atenção à anatomia do líder populista.
É um excelente trabalho de Mudde e Kaltwasser, visto que é realizada uma descomplicação do tema, atendendo à sua origem, o processo de transformação até à atualidade, o que parece ser a seleção regional, onde são mencionados inúmeros nomes, desde Sarah Pallin, a candidata vice-presidencial republicana, Hugo Chávez, o ex-presidente venezuelano, Jörg Haider, ex-presidente do BZÖ, ou Jean-Marie Le Pen. É uma leitura necessária a todos para o entendimento do fenómeno político, priorizando o conhecimento das suas consequências positivas e negativas para a democracia, e, consequentemente, das formas de combate.
Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Escrito por: João Fonseca
Editado por: Mariana Mateus
Um pensamento sobre “A Estante – “Populismo”, a realidade do fenómeno político”