A importância de divulgar a arte feita por mulheres

Fonte: Guia ilustrado do livro de Linda Nochlin’s “Why Have There Been No Great Women Artists?”

Desde os primórdios da história que o papel da mulher na sociedade foi colocado no espaço privado, sendo este o seu lugar de esfera de atuação e de relevância em que, devido à divisão sexual do trabalho, ficavam responsáveis pelas tarefas domésticas e pela prestação de cuidados no seio familiar enquanto que aos homens era entregue o domínio e a soberania do espaço público.

Isto resultou numa desigualdade de representação e de ocupação das mulheres no espaço público que é, ainda hoje, muito vigente, levando a que seja cada vez mais importante trazer e divulgar o trabalho realizado por estas mulheres como forma de reconhecer e valorizar a contribuição feminina em diversos campos.

Já nos dizia, no final dos anos 1980, a historiadora francesa Michelle Perrot que “no palco da memória, as mulheres são sombras ténues”.

Desta forma, apesar das crescentes vitórias e da contínua crescente conquista do espaço público, ainda hoje existe uma forte inexistência da presença da mulher como autora e uma vincada invisibilidade feminina nos diversos campos da vida coletiva, como é o exemplo da arte em que a contribuição destas autoras, além de pouco reconhecida, é muitas vezes silenciada ou posta no anonimato.

Recuperar a presença destas mulheres é assim repensar o lugar atribuído a estas uma vez que o papel da mulher na história da arte, no século XIX, é uma expressão da sua condição histórica submissa e inferior ao homem em que só apareciam e ganhavam destaque como objeto de contemplação nas obras efetuadas por homens, sendo vistas como seres desprovidos da mesma capacidade intelectual e artística dos companheiros.

A imagem da mulher era feita à imagem do homem de modo que as construções sociais do papel da mulher eram perpetuadas e fortalecidas. Estas eram domésticas e cuidadoras sendo, assim, mantido o controlo da sociedade patriarcal sobre o corpo e a representação feminina.

Guerrilla Girls, 1985-90 | Fonte: khanacademy.org

Contudo, esta problemática da representação das mulheres em obras masculinas, ainda que importante, não se configura como o debate central desta análise, mas sim a lacuna da produção artística oriunda de mulheres na história da Arte.

Este debate não é novo e iniciou-se em Janeiro de 1971 com o lançamento do livro “Why Have There Been No Great Women Artists?”, de Linda Nochlin, que percorre o longo caminho da história e regista as inúmeras construções sociais e constrangimentos que serviram de obstáculo ao destaque das mulheres nas artes, contrariando a ideia até aqui perpetuada da genialidade artística como talento exclusivo masculino. Mais tarde, é o seu livro “Women, Art and Power and Other Essays” de 1991 que vai revolucionar a história da Arte, desconstruindo as bases ideológicas de uma sociedade de matriz patriarcal.

Assim, descortinar as autoras presentes na história e na arte é também descortinar as inúmeras outras histórias de mulheres que foram invisibilizadas e anonimizadas ao longo do tempo. É uma maneira para que todas as mulheres se sintam representadas e reconhecidas e uma forma de espelhar a sua luta, com o objetivo de alcançar uma desconstrução total dos preconceitos e discriminações até aqui perpetuados e, consequentemente, de alcançar uma sociedade mais igualitária.

Este descortínio passa por divulgar e salientar as autoras do presente, mas também por recuperar as mulheres relevantes em várias áreas de atuação da vida coletiva, da literatura à escultura, que já não se encontram entre nós, sinalizando que a história escondeu dos seus museus e das páginas dos seus livros, mas não apagou o registo destas mulheres.

É saliente e visível o quanto a história tradicional, de uma forma não inocente, tem colocado num plano subalterno e negligenciado a arte produzida por estas artistas com intuito de manter o status quo e o espaço público como esfera de atuação controlada e dominada por homens.

Contudo, a nossa história coletiva tem também como sujeito principal mulheres. Sim, temos pintoras, escultoras, escritoras, cantoras, atrizes que foram além das construções sociais dos seus papéis estabelecidos na sociedade e afirmaram-se como protagonistas.

Protagonistas estas que através da sua arte retrataram as suas dificuldades e a sua história num mundo marcado por misoginia e relações de discriminação e, por uma sobrecarga extrema de responsabilidades familiares e domésticas provenientes dos papeis tradicionais, sendo este um dos principais constrangimentos à ação destas artistas – a dupla jornada que sempre tiveram de enfrentar.

Existe muita coisa que separa estas mulheres, mas também existe algo que as une: o desejo incontrolável de derrubar barreiras e normas sociais e construir a sua narrativa a partir daquilo que melhor fazem: arte. São mulheres que lutaram por um mundo melhor e que procuraram reescrever a história pelos seus olhos através de um poema, de um quadro, de uma música, de uma escultura.

Vejamos o caso português, que nomes são falados nas escolas? Quantas artistas existem nos museus e nos pódios das ditas cujas críticas artísticas? O que se sabe destas mulheres? A resposta é que se sabe muito pouco, infelizmente.

É importante salientar a necessidade de uma revisão da história da arte de forma a quebrar a dominância do olhar heteronormativo do homem branco europeu num sistema patriarcal e misógino, adotando uma abordagem intersecional e divulgando a contribuição dos grupos até aqui subalternizados como é o caso das mulheres, mas também as pessoas negras, a comunidade lgbt+, a população indígena.

Tudo isto é alcançado a partir de uma educação que tenha em mente a quebra do paradigma dominante – educação esta que consciencialize e liberte a sociedade das amarras sociais até aqui estabelecidas. Enquanto isso não acontece é importante relembrar as mulheres artistas que moldaram e moldam a nossa história, salientando que a história escondeu, mas não apagou ,estas mulheres.

Escrito por: Renata Rocha (HeforShe ISCSP)

Editado por: Mariana Mateus

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