“Olá estagiário Super-Herói!
A Nossa empresa é a melhor das melhores em tudo o que possas imaginar! Temos o melhor ambiente de trabalho e a melhor equipa de sempre! Qual Google, qual quê…
Para vires trabalhar connosco precisamos de muito pouca coisa da tua parte: tens de ser recém-licenciado, com uma média superior a 18 valores, fluente em 5 línguas e experiência de 3 a 5 anos na área. Tens que dominar, a nível profissional, Photoshop, Adobe, Java, plataformas Microsoft Office, editores de vídeo e outros programas super complexos de análise de dados, arquitetura e auditorias. Por fim, tens que ter conhecimentos básicos de Marketing, Engenharia Aeroespacial, Agricultura, Comunicação Social, Ciências Matemáticas, Medicina, Informática e que desenrasques qualquer outra coisa.
Como vês, nada de especial! Envia-nos o teu CV de 20 páginas e uma carta de recomendação e começa já a trabalhar connosco! (*este “já” é relativo porque: a) Em princípio não te vamos responder; b) Se te respondermos é daqui a um mês ou assim, tudo sem pressas; c) Só queremos o teu CV e a tua carta de recomendação para fazer parte da nossa coleção; d) Não escrevemos as condições porque já sabes como elas são e fica mal escrever para que toda a gente veja… São super aprazíveis! 9 horas por dia e pagamos os custos de transporte! Não interessam os teus horários académicos! Tudo pela experiência!).
Apresenta-te como nós queremos que tu sejas! Super criativo, pró-ativo, metódico, organizado, pragmático, extrovertido, e mais que pronto para trabalhar – a tua licenciatura preparou-te super bem para isto! Afinal, és um super-herói!”
Este poderia ser um cenário de vaga disponibilizada no Linkedin, provavelmente com mais de um mês, já que não é costume das empresas retirá-los quando é devido.

Mas agora fora de brincadeiras. Se antes da pandemia a procura de estágios já era complicada, agora está ainda pior. Para um estudante universitário a procura de estágio é fundamental, não só para o seu futuro enquanto profissional, mas também para decifrar as suas preferências e ambições. O cenário complica-se quando a oferta não se adequa à procura.
Um estágio tem como foco um período de permanência numa determinada instituição, empresa ou organização, na qual se é supervisionado e se aprende a praticar um determinado ofício para, posteriormente, exercê-lo profissionalmente. Ora, se os contratantes procuram alguém cujas competências ultrapassam as de Apolo, – Deus da Perfeição – estão apenas em busca de um empregado a full-time, porém, com algumas diferenças. Desde a falta de salário à consequente exploração no que se refere ao horário de trabalho – já para não falar das expectativas desmedidas perante o conhecimento e aptidões do estagiário.
Para combater esta realidade, em outubro de 2020, os eurodeputados propuseram à Comissão Europeia e aos Estados-membros a criação de “um instrumento jurídico comum que garanta e imponha uma remuneração justa aos estágios e aos programas de formação e aprendizagem no mercado de trabalho da UE”. Isto porque considera a existência de estágios não remunerados como uma forma de exploração dos jovens e de violação dos seus direitos.
Resta esperar para saber se esta medida terá consequências positivas ou se, por outro lado, contribuirá para a tendência do aumento de desemprego jovem – que em Portugal é de 26,3% – visto que os estágios passarão a ser remunerados.

Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Escrito por: Guilherme Pinheiro e Inês Conde
Editado por: Gabriel Reis