A Estante – “A Balada dos Pássaros e das Serpentes” o regresso do universo d’Os Jogos da Fome por Suzanne Collins

Passados 10 anos, Suzanne Collins regressa em grande com uma prequela do universo d’Os Jogos da Fome. Na “Balada dos Pássaros e das Serpentes”, acompanhamos a vida de um Coriolanus Snow de 18 anos – o tirano presidente de Panem – os dramas, desafios, manipulações e outras peripécias que recheiam a sua vida durante a estreia dos décimos Jogos da Fome.

Fonte: Editorial Presença

A Balada dos Pássaros e das Serpentes situa-nos, no famoso universo distópico de Panem. Uns EUA reconstruídos, à relativamente poucos anos, de uma violenta guerra. Coriolanus Snow, a personagem principal da obra, conduz-nos no seu difícil percurso de vida até ao sucesso, enquanto é destacado para mentor de um tributo dos décimos Jogos da Fome, Lucy Gray. O que indica que irá ser um terrível momento para Coriolanus, encarregue de um tributo do miserável Distrito 12, acaba por ser motivo para diversas aventuras, estratégias mentais, tudo em direção ao êxito que tanto aspirara.

O livro é uma obra de arte para os fanáticos da franquia, pois é esclarecedor em muitos níveis, o que não aconteceu em livros passados, onde acontecimentos apareciam sem contexto. Com o decorrer da vida de Coriolanus, ficamos a saber que a 10ª edição dos Jogos da Fome é extremamente importante para a introdução de aspetos que marcam este universo. É nesta obra que a mentoria é implementada – o que estabelecia, pela primeira vez, uma relação que não fosse de ódio entre os tributos e as pessoas do Capitólio. Ainda dentro das relações Tributo-Capitólio, sugere-se a interação do público através de um sistema de apostas e de patrocínios onde seria possível apostar-se no tributo preferido e ajudá-lo a vencer (enviando-lhe mantimentos), em troca de uma quantia generosa caso este vencesse – mestria de Coriolanus.

“Snow always lands on top”.

Para uma pessoa que acabou de ingressar no ensino superior, a abordagem académica que o livro traz fez me sentir em sintonia com Coriolanus – o stress e a ansiedade que ele sente na Academia é equivalente ao que sinto pelos corredores da faculdade. A preocupação dele com o sucesso, a bolsa e os prémios, a ânsia pelo triunfo e medo do insucesso vinculou-me ao personagem e ainda me agarrou mais ao livro.

Outro aspeto que me deu grande prazer ler foi a vertente política, desta vez, mais desenvolvida. Nos primeiros três livros: Os Jogos da Fome (2008); Em Chamas (2009); A Revolta ou A Esperança (2010) – o foco situa-se em Katniss Everdeen, o símbolo da revolução contra o poder opressor e repressivo do Capitólio, os seus conflitos amorosos, os sonhos e pesadelos transtornantes, as terríveis condições em que viviam as pessoas da periferia, a fome e miséria. Mas aqui o foco é o “Caos, controlo e contrato. Os três C” que sustêm a ordem do Estado. A ideia de que o Capitólio é essencial para estabelecer a ordem em toda Panem é discutida várias vezes sob vários contextos e é incrível observar o progresso e a formulação da opinião de Snow em relação a tudo isto. O livro abre, exatamente, com frases de Thomas Hobbes, Locke, Rousseau, W. Wordsworth e Mary Shelley, a evocarem a importância do contrato social, das leis, da guerra e do estádio natural, do poder e da sua manipulação.

Collins falhou, contudo, no esboço ideal da psique vil e fria de Coriolanus Snow, apresentando-nos a personagem com pouca cobertura acerca da pessoa que consta na história de Katniss Everdeen. Como Susannah Goldsbrough escreveu para o The Telegraph “Quando se trata de escrever sobre os refúgios obscuros da psique humana, Collins está como um peixe fora de água”. Esperava mais do psicológico sombrio de Snow, e, apesar de termos um crescente desgosto e aversão à ala rebelde, aos Distritos e a necessidade do Capitólio para manter a ordem, tivemos resquícios de ideias perversas, autoritárias e tirânicas.

De um modo geral, o livro agradou-me mais do que eu estava à espera, trazendo personagens autênticas e interessantes, mostrando, em forma de ficção, o poder manipulado e sujo que um Estado pode exercer sob uma Nação, e fomentando uma vontade em saber mais da história e do percurso de vida de Coriolanus Snow até chegar ao cargo de presidente de Panem. A adaptação do livro para filme já está confirmada – votos para que a adaptação não retire, como muitas vezes faz, o brilho das histórias em livro.

Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do Desacordo ou dos seus afiliados.

Escrito por: João Miguel Fonseca

Editado por: Mariana Rodrigues

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