No universo da formação escutista (tendo em referência a organização do CNE – Corpo Nacional de Escutas), a última etapa/secção que marca a preparação da autonomia completa do jovem/adulto (constituída normalmente por elementos dos 18 aos 22 anos), a IV.º Secção, distingue-se das demais por toda a sua envolvente no Caminheirismo. Por outras palavras, a IV.º Secção e o Caminheirismo em si, é o culminar da proposta educativa do CNE, fixando o termino da formação de um escuteiro. Mas o que diferencia tanto esta última Secção no Escutismo? O que torna o Caminheirismo particular? Qual a diferença em ter ao pescoço o “lenço rubro” e o que o torna importante?
Os elementos da IV.º Secção são denominados Caminheiros. Este nome advém do conceito de Caminheirismo, inspirado e baseado na ideia do fundador do Escutismo Robert Baden-Powell, presente num livro escrito pelo mesmo, que serve de referência para qualquer Caminheiro ou qualquer outro que não tenha alcançado este patamar, intitulado A Caminho do Triunfo.
Inspirado numa comparação com uma viagem, Baden-Powell apresenta o Caminheirismo como uma caminhada que simboliza o nosso percurso enquanto pessoa na vida e a forma como nos desenvolvemos e crescemos no Caminho. Desde as contradições da vida às várias decisões que temos que tomar, o livro remete para a ideia de que mais importante do que atingir a meta do nosso Caminho o verdadeiro significado e felicidade está em fazê-lo e saber superar-nos a nós mesmos e orientar-nos sempre pela escolha certa, tendo em vista a transformação da pessoa e deixando o passado para trás indo em busca do Homem-Novo.
A maioria dos jovens/adultos entre os 18 e os 22 anos encontram-se numa fase cheia de escolhas e desafios com os quais nunca se tinham deparado, desafios estes que caracterizam a entrada na vida adulta. O Caminheirismo ensina que todas as dificuldades encontradas, nas novas experiências com que nos deparamos (com os outros, com o meio à nossa volta e até com nós mesmo) são normais, e que o importante e o que caracteriza um Caminheiro está em saber como superar essas adversidades e ser uma referência pelo seu estilo e escolhas.
Revela-se então importante para estes jovens/adultos terem alguém que os acompanhe nesta fase e que partilhe os mesmos desafios e envolvimentos de qualquer Caminheiro, sendo de destacar o impacto e convívio com outros Caminheiros, que para além de poderem criar grandes amizades mantêm a familiaridade com o movimento. Muitos têm a sorte e possibilidade de se manterem no Clã (denominação para a unidade que é a IV.º Secção, composta por Caminheiros, Dirigentes e no caso noviços/aspirantes que ambicionam ser Caminheiros) da sua zona. Outros, porém, têm de abandonar o seu meio por diversas razões, como a habitual ida para a faculdade longe da sua casa.
Neste contexto surgem também, e presentes em alguns pontos do nosso país, os Clãs universitários que dão resposta a este problema. Os Clãs universitários são constituídos por Caminheiros inseridos no Clã do seu Agrupamento, que se encontram no entanto a frequentar o ensino superior longe da sua localidade. Estes pretendem criar mecanismos de motivação à continuidade do indivíduo no Escutismo, e claro, ter em vista um enriquecimento mútuo entre Caminheiros de diferentes locais que podem trocar pontos de vista e métodos diferentes dos Clãs de onde são oriundos. O crescimento do espírito da Fraternidade do Caminheirismo e o abrir de horizontes são outros objetivos.
O Caminheirismo é caracterizado também pela forte independência do jovem/adulto e da forma como este deseja fazer o seu Caminho, com a referência de ser feliz! O Caminheiro é o principal responsável pelo seu rumo, e individualmente ou comunidade (juntamente com o Clã) se pretende alcançar e construir algo. É ele o responsável do seu destino e faz parte do elenco principal da mudança e do concretizar. Fazer Caminho, surge na IV.º como um estilo de vida a assumir, com o foco de cumprir a missão de continuar a caminhar deixando “o mundo um pouco melhor que o encontramos” como diz o fundador do Escutismo. A divisa do Caminheiro, “Servir”, impele a atos de concretização do Caminheiro principalmente como pessoa a ter em referência e como cidadão feliz, responsável e útil no serviço ao próximo e na ajuda aos mais necessitados, distribuindo a felicidade do seu Caminho à Comunidade que o rodeia.
No livro, A Caminho do Triunfo, a frase de Baden-Powell que melhor caracteriza o Caminheirismo é “uma Fraternidade do Ar-Livre e do Serviço”. E no fundo a vivência do Caminheirismo pretende instruir e ensinar os jovens/adultos a achar o equilíbrio no percurso da sua vida entre um espírito de Fraternidade (união com o próximo, nomeadamente tendo como referência a Fraternidade de Caminheiros que devem funcionar como irmãos), o espaço ao Ar-Livre (aproveitando os espaços e atividades em campo para despertar a autonomia, camaradagem e cooperação entre todos, e o conhecimento dos próprios limites do indivíduo), e a ação do Serviço (onde estamos ao lado de quem tem maior necessidade, de servir e apoiar a comunidade que nos rodeia, e ter um efeito direto na vida do próximo). Ao juntar tudo isto consegue-se mais tarde, dentro e fora do Escutismo, levar como mote e roteiro na sua vida tudo o que é aprendido.
Ser Caminheiro é ser muito, mas ter a humildade de ser para o próximo e por ele ter sacrifício. É ser o construtor e artesão de um Mundo-Novo deixando a marca de felicidade onde passarmos, porque Caminheiro é ser feliz! Caminheirismo para além de representar uma secção e uma etapa, é uma atitude! Um estilo de vida que nos impele a viver dessa forma!
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Escrito por: João Feliciano
Editado por: Mariana Mateus