Joana Estrela é uma artista que tem vindo a ver o seu trabalho reconhecido, principalmente desde que ganhou o I Prémio Internacional de Serpa para Álbum Ilustrado, com a obra Mana. Um dos seus recentes trabalhos foi divulgado por vários jornais online, devido à sua originalidade. Decerto que já ouviram falar do “Mapa para chorar em Lisboa”. O Desacordo esteve à conversa com a autora que falou um pouco do seu trabalho e experiência pessoal.

Nascida em Penafiel a 1990, Joana Estrela começou a desenhar retratos da sua família desde criança. Estudou Design de Comunicação na Faculdade das Belas Artes do Porto, cidade onde trabalha em ilustração e banda desenhada.
As obras de Joana incluem sempre texto e imagem, pois a autora sente uma maior ligação ao texto quando este está acompanhado. Não é necessário ter os dois elementos para contar uma história, mesmo que no seu trabalho sinta que é crucial a presença dos dois. A artista defende que as imagens e o texto não têm de ter informações semelhantes, até se podem opor ou contradizer, tendo cada elemento uma informação diferente a ser transmitida. Desta forma não há repetição de informação e, na visão de Joana, pode ficar mais interessante. Quanto à inspiração para as suas obras, a autora diz ser muito atenta ao mundo que a rodeia, pelo que no seu trabalho podem estar refletidas memórias e a sua própria perceção do que acontece à sua volta.
Joana Estrela não faz apenas ilustrações para os seus próprios trabalhos, por vezes também faz para outros autores, como Ana Pessoa, com a obra Aqui é Um Bom Lugar e O que há neste lugar? de Maria Manuel Pedrosa. É curioso saber como se sente a artista face à diferença entre fazer ilustrações para uma obra sua ou para outrem, sendo que decidimos fazer a pergunta. Joana afirma que ambos os trabalhos são difíceis, porém, quando faz um trabalho só seu e cria “o seu bebé”, como descreve, sente uma maior responsabilidade e fica mais ansiosa. Todavia, acaba por ser mais interessante ter de passar pelo processo criativo, pode ser mais flexível e tem um maior poder na obra, no que toca a mudar certos pontos e editá-la. Quanto às obras de outrem, é algo que também gosta de fazer e não tem muitos problemas, principalmente porque as pessoas com quem trabalhou sempre perceberam o seu trabalho e aceitaram sugestões.
A artista já desenvolveu alguns trabalhos ao longo do seu percurso, e, por isso mesmo, tentámos perceber qual o trabalho pelo qual sente um maior carinho, ao que Joana respondeu ser Mana, a sua obra premiada. A razão pela qual escolheu este trabalho deve-se ao facto de ter sido uma obra escrita num período onde estava desempregada, por ser sobre a sua irmã e um projeto que ficou na gaveta durante muitos meses, pois não conseguiu que fosse publicado. Deste modo é uma obra importante para si, tendo ganho um prémio do qual não estava nada à espera e que foi um grande impulso na sua carreira. Na altura que o ganhou, Joana não se encontrava em Portugal, estava de férias e ficou muito contente e surpresa.

Muitas das obras de Joana Estrela estão classificadas para crianças, e algumas até se encontram no Plano Nacional de Leitura dos mais pequenos, porém, a artista contou-nos que quando está a trabalhar numa obra não pensa no público para que esta se adaptará, escrevendo segundo os seus padrões. Face a isto, Joana não considera que as suas obras sejam mais adequadas para uma certa faixa etária e admite que, mesmo que comprem os seus livros para dar a uma criança, haverá sempre o intermediário, como os pais, que irão ler a obra e poderão até se identificar com ela e achá-la interessante.
Joana Estrela passou uma temporada em Budapeste e na capital da Lituânia, Vilnius, lugares estes que acabaram por influenciar o seu trabalho de alguma forma. Em Budapeste, a artista estava em Erasmus e começou por fazer pequenas publicações online com apontamentos, piadas e situações que aconteciam no dia a dia. Acabou até por desenvolver um primeiro trabalho que não chegou a publicar. Apesar de não ter avançado com o projeto, este contribuiu para desenvolver o seu potencial e para trabalhar melhor. Foi em Vilnius que a artista foi trabalhar para uma organização LGBT e foi o período em que escreveu Propaganda, o seu primeiro livro. Este período da sua vida fê-la evoluir pessoal e profissionalmente, com uma grande diferença cultural, deparando-se com uma sociedade muito homofóbica. Nessa organização teve ainda desafios que não previa, mas foi muito cativante, pois os voluntários tinham de organizar eventos para população, entre outros.
Como obras mais recentes temos o Map For Crying Travellers, a edição em Lisboa, e o Guide to ordering Coffee in Portugal. O mapa para chorar foi feito primeiramente para o Porto, e como surgiu essa ideia? Bem, no verão, com o boom do turismo no Porto, a autora viu imensos artigos que diziam, Os 10 melhores sítios para isto e aquilo, e decidiu pegar nisso e fazer algo cómico. Joana Estrela partilhava casa nessa altura, então sentia que não podia estar a chorar sozinha, na sua privacidade. Sendo assim, ia para sítios na cidade onde ninguém a chateasse- daí surgiu a ideia que pegou. Pode-se assim dizer que este projeto surgiu um pouco de uma experiência pessoal. Quanto ao segundo trabalho referido, o guia para pedir café no nosso país, há diversas formas de comunicar em Portugal, cada zona tem as suas expressões, e é isto que é representado no seu trabalho. Para além deste projeto ajudar estrangeiros, a artista espera que muitos portugueses possam também aprender, já que, ela mesma aprendeu muito ao escrevê-lo.

A autora também dá workshops que dependem do contexto e convite que lhe são feitos. Na maioria das oficinas o objetivo era meter os alunos, independentemente da idade, a criar histórias e narrativas com texto ou imagem, mas normalmente com os dois elementos devido ao trabalho que a mesma faz. Um dos últimos que fez consistia em criar um diário gráfico com diversas ideias, que se tornou num exercício super dinâmico pois tinha pessoas de diversas idades a interagir e a partilhar experiências, durante uma semana.
A arte é algo que faz parte da vida de Joana Estrela, e isso é inquestionável. Ao perguntarmos se a arte tem importância na sociedade em diversas vertentes, a autora respondeu que a arte está agora mais difundida na nossa sociedade do que antes. Segundo a artista, a cultura é importante e acha que cada um se pode rever em muitas coisas que vemos e pode até ajudar a encontrar algum sentido quanto à vida e a nós próprios (diz isto como espetadora e consumidora de cultura).
Como freelancer, e para quem quer ser freelancer, Joana diz que não vai acontecer tudo de repente, que devemos trabalhar arduamente, e reforça dizendo que é importante trabalhar sempre, mesmo que o trabalho não tenha logo reconhecimento. Temos o exemplo da sua obra Mana, que nos demonstra que é importante não desanimar e que não se sabe o dia de amanhã. Pedimos ainda que descrevesse os seus anos de faculdade numa palavra, e a que escolheu foi stress. Para si foram anos muito ansiosos, a pressão que fazia em si própria era muita e admite que precisava de relaxar um pouco mais.
Para terminar, tivemos curiosidade em saber que trabalhos futuros poderíamos esperar da artista, e a resposta foi uma banda desenhada ainda este ano, e de resto apenas para o próximo ano.
Escrito por: Rafaela Boita
Editado por: Mariana Mateus