
Poucos em Portugal acreditam num clube nacional campeão europeu, no entanto, deviam. É possível e não tem de estar assim tão longe das nossas ambições.
O destaque não pode ser a eliminação da Juventus, nem o fim da era Ronaldo. O destaque tem de ser o Ajax.
Mais uma vez esta equipa volta a surpreender e com mais um jogo extraordinário elimina a Juventus, num confronto já com grande tradição, inclusive duas históricas finais em 1973 e 1996. Depois de em 2017 ter surpreendido, ao chegar à final da Liga Europa e entrar para a história como equipa mais jovem de sempre a alinhar numa final europeia, afirma-se agora definitivamente como a sensação que todos querem ver jogar, relembrando até a gloriosa fase do “futebol total” dos anos 70. Já depois de ter eliminado o campeão europeu Real Madrid com uma goleada histórica no seu próprio estádio, a equipa holandesa segue agora para as meias finais da maior competição de clubes onde vai defrontar o Tottenham.
Numa altura em que o fosso financeiro dos clubes das principais ligas é cada vez maior para os outros, as hipóteses de uma equipa como o Ajax, ou como as nossas, chegar longe numa competição destas é também cada vez mais difícil. No entanto, é com os bons exemplos que temos de aprender e este Ajax mostra-nos como lá chegar. Primeiro reconhecer que somos de uma liga periférica e portanto não podemos lutar com as mesmas armas, principalmente financeiras. Depois procurar as nossas próprias armas e, por fim, ter a ambição suficiente de achar que é possível. Nos últimos anos temos tido vários exemplos de clubes que tentam “comprar” uma identidade e um projeto capaz de os levar aonde nunca chegaram, porém temos visto que os resultados não chegam (casos de PSG e Manchester City). Criar uma identidade própria sempre resultou melhor e provavelmente não existe melhor exemplo que o Ajax, clube sempre fiel a si próprio criando de dentro para fora e produzindo algum do melhor futebol que o mundo já viu.
Algumas curiosidades desta equipa até ao momento:
Neste momento é a equipa com mais golos da Europa (155);
Primeira vez na história da competição que uma equipa chega às semifinais após ter passado por três fases preliminares;
Primeira vez na história das competições europeias a vencer, em simultâneo, Real e Juventus nos seus estádios, na mesma temporada;
Na partida frente à Juventus, o Ajax completou 1750 partidas consecutivas a alinhar com pelo menos um jogador da sua formação no onze titular. Sequência iniciada em 1982, o que demonstra bem a filosofia do clube;
Para esta época o Ajax tem apenas 50 milhões de euros investidos na equipa, comparando com outros adversários que já eliminou, em que os valores ascendem às várias centenas de milhões investidos.
Os outros não são grandes e nós não somos pequenos. Portugal não é pequeno e não se pode contentar com sonhos nem com “estamos destinados a”, temos de nos convencer que não são só sonhos, são e devem ser ambições legítimas. O nosso problema muitas vezes é acharmos que as coisas são e vão ser de uma forma só, sendo surreal pensar que podem ser de outra. Mas podem. No caso do futebol, que melhor exemplo que o do Ajax para nos mostrar que podemos criar, porque talento não nos falta, uma ideia nossa, uma identidade própria que nos permita competir com os melhores, os mais poderosos financeiramente. Neste momento, vemos o Benfica como o clube mais próximo dessa ideia e a lutar por essa ideia. O caminho parece ser esse, tem de ser esse, não procurar respostas lá fora (porque nem adotamos as melhores, nem temos bom senso para perceber que algumas não encaixam aqui), nem desperdiçar tudo o que de bom temos.
Em tudo a resposta começa por dentro e nós temos, podemos e devemos muito mais.
Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Escrito por: Eduardo Silva
Editado por: André Blayer