Fala-se da igualdade de géneros (ou da falta dela), da violência doméstica, da violência no geral, fala-se dos animais que sofrem nesta indústria sem moral. Fala-se da crise ambiental, das redes sociais e dos vícios da tecnologia, do Brexit e da Coreia do Norte. Fala-se dos populismos.
Hoje em dia toda a gente fala sobre tudo, toda a gente sabe o que diz, toda a gente pensa que sabe o que diz… “Estes tempos já não são o que eram…”, dizem, quando o tema é a música, os jovens, os valores e a moral. A questão da privacidade, dos drones e as guerras claro. Se calhar é da natureza humana, está em nós. Vemos os noticiários, os jornais, as redes sociais, e o que salta à vista? Defeitos do Governo, seja ele qual for, investigações e casos de corrupção, crimes e tragédias, crises pelo mundo fora. É raro termos algo realmente bom, ou melhor, é raro termos algo apenas positivo a ser valorizado. É claro que é preciso fazer críticas ao Governo, é preciso saber o que se passa e o que não é bem feito. No entanto também é preciso dar atenção ao lado positivo, e engane-se quem pensa que o bem feito não precisa de ser mostrado. Muitas pessoas sabem mais sobre a vida de certas celebridades do que dos próprios amigos. Sabem todos os problemas e todas as soluções. Tantas certezas.
Sabem tudo o que querem, acham que está tudo à mão, mas nem tudo está à mão, nem tudo é fácil e nada é certo. Pensam que sabem tudo, que estão sempre informados, sempre ligados e sempre presentes, que são cidadãos do mundo. Mas só sabem aquilo que lhes mostram.
Toda a informação que passa pelos vários meios tem aspetos importantes obviamente e há sempre um lado positivo em termos este acesso facilitado, contudo grande parte é irrelevante, outra grande parte embora sobre aspetos importantes é só introdutória ou aborda mais o aspeto negativo e apenas uma pequena parte da informação que está à vista é positiva ou aborda aspetos positivos. Quando dizem que está tudo mal todos acreditam, mas quando dizem que está tudo bem todos acreditam também e neste caso não se trata de tempos modernos, sempre aconteceu. “A primeira característica da multidão é a tagarelice irrelevante”- Søren Kierkegaard. O problema são os exageros, os extremos, essa é e sempre foi a questão.
Não há notícias positivas nem negativas, há formas de abordar temas e há formas de escolher temas.
O equilíbrio não está na mentira nem na manipulação da realidade, mas também não está em mostrar só um lado. Precisamos, mais do que nunca (porque vivemos sempre no agora), de perceber que também há um lado bom, não para nos enganarmos a nós próprios, mas porque de facto ele existe e sempre existiu, a nossa natureza é que geralmente não o priveligia no que toca a encarar a realidade.
Quando 90% do nosso tempo somos bombardeados com mensagens negativas, muitas vezes disfarçadas em ironia, manipulação e desonestidade, é natural que tudo o resto, toda a nossa vida, dia a dia, todo o nosso pensamento, tenha tendência a tornar-se mais negativo também. Não é o negativo que nos vai atrair coisas positivas para o futuro apenas por nos alertar para os perigos, nem é o positivo por si só que nos vai trazer coisas positivas. Uma sociedade é feita de indivíduos, e a vida do indivíduo vai influenciar a vida da sociedade. Todos somos influenciáveis, não é pessimismo, é um facto. Mas também é certeza minha que nos podemos influenciar de uma melhor forma, não é otimismo.
Se queremos ter uma esperança concreta e vontade de melhorar o mundo temos de ser alertados e acordados para os seus (nossos) males, mas se só nos concentrarmos neles não vamos acordar, vamos ceder e entregar-nos a eles. Precisamos de equilíbrio. O universo, a natureza, tudo à nossa volta funciona devido ao equilíbrio, nós não somos diferentes, nós somos a natureza, nós somos o universo.
Não é achar que está tudo mal e deitar tudo a perder ao apostar em políticas conservadoras e protecionistas, mas também não é achar que está tudo bem e deixarmo-nos levar pelo que temos sem pensar só porque parece resultar. Precisamos de ver mais notícias positivas, precisamos de lhes dar mais valor, não porque temos de as criar para nos sentirmos melhor, mas porque elas existem e não são valorizadas. Poucos sabem as coisas boas que se passam por este mundo fora, porque a maioria está demasiado concentrada nas más ou distraída com as irrelevantes.
Também acontece que muitas das más se vão tornando “banais” por serem tantas e “passarem” tão rápido. O foco dado é passageiro, incorremos no risco de relativizar e por vezes nem mostramos o lado positivo de certos acontecimentos nem mostramos o mau como devíamos, com a devida atenção e importância.
Há cerca de um mês vimos uma iniciativa de jovens, uma manifestação pela ação contra a crise ambiental, eles que muitas vezes são acusados de não terem um papel ativo na sociedade, e também por esse aspeto, mas não só, foi um acontecimento positivo, no entanto se calhar não foi dado o valor suficiente, a atenção suficiente, e se calhar deu-se mais atenção às críticas a este mesmo movimento, aos jovens, quando são eles os mais prejudicados nesta sociedade pois vêm constantemente o seu futuro condicionado por escolhas em que não têm o direito de participar…
Por assustador que pareça eu sinto cada vez mais que o negativo já não é uma escolha, é uma obrigação, é um desejo generalizado e um hábito já quase impossível de contrariar.
Um dia ouvimos falar das violações dos direitos humanos na Coreia do Norte, noutro são na Venezuela, e noutro alguma catástrofe natural num país em desenvolvimento. Esta última não passou só porque deixámos de lhe dar atenção e as primeiras vão continuar mesmo sabendo que amanhã já não vão ser notícia. O risco de relativizar e a ignorância de achar que se está dentro dos temas… Não é por vermos meia dúzia de parágrafos e meia dúzia de imagens num ecrã que sabemos o que se passa em determinada situação. Podemos ter uma noção, e temos, hoje em dia, cada vez melhor noção do que se passa à nossa volta, mas é com arrogância e ignorância que podemos dizer que sabemos realmente o que se passa, porque só estando e vivendo as situações é que as conhecemos verdadeiramente. Equilíbrio e bom senso.
Neste país há muita tendência para não darmos valor a nós próprios e desta Europa só temos más notícias, mas como de costume lá fora é mais fácil perceberem e neste momento “Portugal é a luz da Europa”- Bernard-Henri Lévy, filósofo francês da atualidade.
Talvez sejam vagas algumas das afirmações neste artigo, mas o objetivo não é mais do que liberdade de interpretação. Ter certezas é algo que nos transcende e duvidar é a nossa sina. Podemos arriscar as certezas e chegar à mesma conclusão de sempre ou podemos esforçar-nos por tentar o equilíbrio.
Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Escrito por: Eduardo Silva
Editado por: Ana Mendes