Foi no dia 15 de março, que os Capitão Fausto lançaram o seu quarto álbum de originais. Em A Invenção do Dia Claro, os cinco rapazes de Lisboa aparecem como homens, com uma maturidade musical de excelência, mostram-se senhores de si mesmos, numa mistura de sons e sentimentos, instrumentais eletrizantes e letras ligeiramente mais sérias do que estávamos habituados.
Em 2011, com Gazela, começou a história de Tomás, Salvador, Domingos, Francisco e Manuel enquanto Capitão Fausto, com hinos à juventude feitos de um rock soberbo com a veia pop a latejar, que Pesar o Sol veio confirmar e aprofundar em 2014. Mas nada fazia prever algo como Capitão Fausto Têm Os Dias Contados, o álbum de 2016 que centrou neles todas as atenções, contando, em modo pop, as histórias de cada um dos membros da banda, mas que são muito mais do que isso.
Com Invenção do Dia Claro temos uma camada soft-rock marcada pelo fim da juventude e as interrogações que vêm com ela, as deambulações sobre o amor, sobre tudo aquilo que escapa quando nos queremos encontrar, sobre o desassossego que é viver com os buracos negros que existem dentro de nós, com a tristeza que temos muitas vezes de esconder, porque não se pode estar “sempre bem”.
O próprio nascimento deste disco foi diferente. A banda partiu em 2017 para São Paulo, Brasil, onde começaram a gravar o disco nos Red Bull Studios por Rodrigo “Funai” Costa, assistido por Alejandra Luciani e Fernando Ianni e produzido em Alvalade pelos Capitão Fausto. Segundo a banda:
“Desde o início que o disco foi imaginado para incluir a ideia que tínhamos de “Brasil” na nossa forma habitual de fazer música. Nunca foi intenção fazê-la à maneira de lá mas sim procurar a apropriação de alguns elementos sónicos ou melódicos mais específicos, retirando-os do seu contexto habitual para servirem as nossas canções. Nos textos fala-se da relação com a rotina, da complexidade das relações humanas e do fatalismo inexorável do amor.”
“Andava malparado e sem saber, nesta história
Se é obrigatório que ela chegue ao final
P’ra todo o mau pecado que vier à memória
Há sempre um argumento que o faz ser bom”
É com Certeza que arranca este novo disco, anunciando oito faixas de uma melancolia alegre, através de um andamento que se transforma à medida que se juntam à guitarra e ao baixo, coros e sintetizadores extraordinários, com uma percussão de fundo a balançar com um temperamento brasileiro, abrindo caminho aos sopros que sublimam a melancolia presente na letra. Assim será até ao Final.
A segunda faixa do álbum, Boa Memória, corta a melancolia inicial com a boa disposição de quem se quer divertir e fugir à entediante rotina. Por sua vez, Outro Lado parece ter sido recusada no álbum anterior, realmente é a única música que não se destaca neste novo disco, como se não tivesse saído do país como as restantes.
O primeiro single, lançado em maio de 2018, e quarta música do álbum Sempre Bem, exprime a ideia de que na rotina do dia-a-dia escondemos a nossa tristeza, na esperança que ela passe:
“Voltar ao sítio escavado
Encontrar lá a tristeza
Se deixar escondida acaba por passar
Deixa-a ficar
Então, há gente que anda a passar pior
Eu não me posso queixar”
Novamente, o instrumental, ao contrário da letra, é alegre, o que evidencia a mensagem transmitida: o instrumental torna a música menos triste, como se fosse o buraco no qual a tristeza foi escondida.
Faço as Vontades com o seu instrumental contagioso e um flow sublime dos sopros, marca a evolução de quem deixou as saias da mãe, e se tornou no alguém maduro e responsável como lhe tinha sido ensinado. É nesta sexta faixa que começamos a reparar no assombroso instrumental por trás da voz de Tomás.
“O bom filho que eu já sei ser
Só sou porque a minha mãe
Insistiu até eu saber
E se eu procuro amor, primeiro dar p’ra depois colher
Acabou por correr tão bem
Contigo eu vou aprender
Só tens de ter pachorra e ficar p’ra ver”
Lentamente é uma gloriosa canção de amor, que se destaca das outras por não falar da falta dele, nem da dor que pode causar, mas sim como nos muda e engrandece, lentamente, apesar de todos os nossos defeitos.
“(Meu amor, só tu me podes mudar)
Eu tenho todos os defeitos que viste e continuas aqui
(Meu amor, só tu me podes mudar)
Não há um dia que eu não pense em ti”
Por fim, Invenção do Dia Claro tem também baladas, Amor, A Nossa Vida e Final choram as angústias do amor, começando ao som do piano, introduzindo um instrumental ligeiro mas opulento, onde mais uma vez se nota a influência brasileira. Em entrevista à Blitz, os artistas explicam a razão pela qual optaram por incluir neste álbum baladas:
“Existe um risco maior em tentar fazer uma música assim. Não queríamos arriscar enquanto não tivéssemos confiança”.
Para quem já conhece o catálogo dos Capitão Fausto, há um perfume de familiaridade no que toca aos ritmos quase canónicos, aos refrões que não nos saem da cabeça, aos instrumentais esplêndidos que nos fazem querer dançar mesmo quando a letra o contradiz.
Já estão marcados os concertos de apresentação: a 4 de abril atuam na Casa da Música, no Porto, e no dia 6 do mesmo mês tocam no Capitólio, em Lisboa. Até lá podes ouvir o álbum aqui.
Classificação TDSessions: 8/10
Escrito por: Isabel Sousa
Editado por: Cláudio Nogueira