Na passada sexta-feira, dia 17 de novembro, fomos presenteados com o mais recente projeto de Morrissey – Low in High School (que pode ser ouvido aqui) -, antigo vocalista dos adorados The Smiths, que, mais uma vez, assinala o seu espírito crítico relativamente a uma sociedade hipócrita.
No seu 11º álbum a solo, o artista de rock alternativo continua o tema do seu último álbum de 2014, World Peace Is None of Your Bussiness, com um ênfase pesado em músicas políticas e anti-guerra. Tanto o é, que a maioria das faixas neste LP concentram-se ao redor de problemas militares e e políticos do mundo atual, como é o caso de “I Wish You Lonely”, “I Bury the Living”, “The Girl from Tel-Aviv Who Wouldn’t Kneel”, “All the Young People Must Fall in Love” e, finalmente, “Who Will Protect Us from the Police?”.
“Tombs full of fools who gave their life upon command
Of monarchy, oligarch, head of state, potentate”
A abertura do LP é feita ao som do glam rock de “My Love, I’d Do Anything for You” que é considerada das melhores letras do conjunto e enquadra-se no espetro pesado das questões pessoais e com fundamentos políticos. Neste mesmo plano de pensamento, encontramos a quinta faixa – “Spent the Day in Bed” – que relata questões existenciais e melancólicas acerca do ato de se esquivar das responsabilidades.
Entra em cena o enigma de Morrissey com “Jacky’s Only Happy When She’s Up on the Stage” que se pode relacionar com o Brexit. É o destaque do álbum onde é contada, de forma divertida, a história do ator cujas ambições ultrapassam o talento.
“”Cue lights! I am singing to my lover at night!
Scene two: everyone who comes must go!
Scene four: blacker than ever before!
Scene six: this country is making me sick!”
Por alguma razão, o fascínio de Moz pelo contacto sexual continua a marcar presença neste projeto, com “Home Is a Question Mark”, onde é facilmente interpretado o exílio auto-imposto de Morrissey em Los Angeles e Roma; “In Your Lap” que no meio de “I just want to sit my face on your lap”, invoca a Primavera Árabe; e, por fim, “When You Open Your Legs” que conta com um timbre à moda espanhola e um coro fantástico.
“Home, is it just a word?
Or is it something you
Carry within you?
I’m happy just to be here
If I ever find home”
Passando para a que me dá mais prazer interpretar, “I Bury the Living”, de cariz anti-guerra, relata na primeira pessoa a história de um soldado com um estereótipo injusto, verdadeiro, empático, doloroso e consciente. Uma faixa grandiosa e pesada, que projeta a culpa naqueles que combateram na linha da frente do cenário beligerante. Não tem o back-up de The Smiths, mas é, igualmente, um projeto sólido e inteligente acerca de um cenário contra a Arab Spring que faz eco à triste história da humanidade.
No ramo dos problemas político-militares, o compositor de 58 anos surpreende-nos com “The Girl from Tel-Aviv Who Wouldn’t Kneel” que, num melodioso e melancólico tango, desbloqueia um século de conflitos no Médio Oriente com a simples frase “And the land weeps oil | What do you think these armies are for?”.
De seguida, encontramos “All the Young People Must Fall in Love” que, para muitos, é a melhor do LP devido às inovações nos arranjos onde se nota claramente uma sonoridade e um arranjo minimalista com um maior poder do piano e da percussão.
Baseada numa experiência com a polícia italiana, o artista do hit “Everyday Is Like Sunday” lança “Who Will Protect Us from the Police?” que, com uma letra anti-fascista, demonstra o toque provocativo de Morrissey, muitas vezes visto como um “cool uncle”.
“Say Daddy, who will
Protect us from the police?
“Baby, God will!””
Neste pernicioso, embora piedoso álbum, Moz concentra-se na afirmação “Society’s hell!”, do seu último trabalho, e desenvolve o tema à volta de conflitos religiosos e políticos. Não há muitos artistas que se comparem a este prodígio espiritual, crítico e corajoso com as suas lyrics recheadas de humor que, num mundo em mudança, dão um certo conforto ao som da sua voz.
Embora já estarmos habituados ao traço converso característico de Morrissey, será para sempre um choque quando nos deparamos com músicas como “Israel” que termina o álbum em grande: sendo uma carta de amor a Israel numa balada em piano e uma crítica anti-guerra que gera polémica política, afirmando que aqueles que criticam têm inveja.
“And they who reign abuse upon you
They are jealous of you as well
Love yourself as you should
Israel”
Há uma certa plenitude na atitude de Morrissey que me agrada, sendo ela a não necessidade de agradar a todos, visto que este é tipicamente um projeto que não é construído para alcançar um público mais amplo que a sua base de fãs (tanto é que muitos afirmam que, após a quinta faixa, só os verdadeiros seguidores de Moz as conseguem escutar com o prazer devido).
E para terminar, embora seja um regresso brilhante e um álbum que traz do melhor de Morrissey e uns arranjos agradáveis, tenho a dizer que acho que sinto a falta da acidez poética e egocêntrica de Years of Refusal, de 2009.
Classificação TDSessions:8/10
Escrito por: Elisa Lamy
Editado por: Ricardo Marquês